Um novo tratamento digital que usa tecnologia interativa para alterar ondas cerebrais mostrou resultados promissores no alívio da dor crônica, apontando para uma possível alternativa não medicamentosa ao uso de opioides. Chamado PainWaive, o sistema foi desenvolvido por pesquisadores da Universidade de Nova Gales do Sul (UNSW), na Austrália, e combina um aplicativo com aparência de jogo e um headset que monitora em tempo real a atividade cerebral do usuário.
Durante o tratamento, o paciente observa uma água-viva flutuando em um ambiente virtual. Conforme a mente se acalma, o cenário muda de preto para tons de azul-turquesa — um reflexo visual das alterações nas ondas cerebrais captadas pelo headset EEG. Essa resposta visual ajuda o paciente a perceber e repetir o estado mental que produz a mudança.
Segundo os criadores, a ideia é treinar o cérebro para regular padrões anormais de atividade cerebral associados à dor neuropática. “Agora, pela primeira vez, você pode ver sua atividade cerebral mudar. E ao vê-la, pode praticar para que isso aconteça de novo”, explica um trecho da descrição do funcionamento da ferramenta.
O primeiro teste clínico da tecnologia, liderado pela professora Sylvia Gustin e pela pesquisadora Negin Hesam-Shariati, acompanhou quatro participantes durante quatro semanas de sessões interativas. Três deles relataram redução significativa da dor, especialmente nas etapas finais do tratamento. De acordo com os pesquisadores, o alívio relatado foi comparável — ou até superior — ao proporcionado por medicamentos opioides.
“A limitação no tamanho, no desenho e na duração do estudo restringe nossa capacidade de generalizar os resultados ou de descartar o efeito placebo”, afirma a Dra. Hesam-Shariati. “Mas os resultados que vimos são empolgantes e nos dão confiança para seguir para a próxima etapa, que é um ensaio maior.”

Todo o kit utilizado no estudo foi desenvolvido internamente pela equipe da UNSW e da Neuroscience Research Australia (NeuRA), o que permitiu reduzir os custos. O headset usa eletrodos úmidos com solução salina e foca a atividade no córtex sensório-motor.
“Trabalhamos de perto com os pacientes para garantir que o headset fosse leve, confortável e fácil de usar”, diz a professora Gustin. “Ter domínio da tecnologia nos dá a possibilidade de, um dia, oferecer o PainWaive como uma solução realmente acessível e viável para o tratamento da dor em casa, especialmente para quem tem acesso limitado aos tratamentos tradicionais.”
Além da tecnologia em si, os participantes receberam instruções simples para configurar o sistema e sugestões de estratégias mentais, como relaxamento e foco em memórias felizes.

“Depois de apenas algumas sessões pelo Zoom, os participantes já conseguiam conduzir todo o tratamento por conta própria”, destaca a Dra. Hesam-Shariati. “Eles se sentiram empoderados para lidar com a dor no seu próprio ambiente. Isso é uma grande parte do que torna esse projeto especial.”
A professora Gustin explica que o PainWaive surgiu a partir de suas pesquisas sobre alterações no tálamo relacionadas à dor neuropática.
Inicialmente, a equipe pensou em usar sistemas EEG comerciais, mas os modelos existentes eram caros ou não atendiam aos requisitos de qualidade. Graças à impressão 3D, o custo de cada headset foi reduzido para cerca de 300 dólares australianos, uma fração dos valores que variam entre 1.000 e 20.000 dólares em sistemas similares.
Atualmente, a equipe está focada em um ensaio clínico randomizado com 224 pessoas com dor neuropática após lesão na medula espinhal. Além disso, o PainWaive é parte de uma série de projetos liderados pela professora Gustin e pela equipe do Centre for Pain IMPACT, da NeuRA, que buscam explorar o potencial do cérebro de se reconfigurar e aliviar dores.
Entre esses projetos está também a Pain and Emotion Therapy, uma terapia digital que treina o cérebro a processar emoções de forma mais eficaz, e o Project Avatar, inspirado na descoberta de que metade das pessoas com lesão medular completa ainda recebe sinais táteis no cérebro — embora não consiga reconhecê-los. Esse último usa realidade virtual e estímulos reais para ajudar o cérebro a reaprender a sensação de toque.
“Muitos dos integrantes da nossa equipe são cientistas-clínicos, e estamos focados em desenvolver tratamentos práticos que possam ser integrados ao sistema de saúde”, afirma Gustin. “É incrivelmente inspirador ver resultados que ajudam a desbloquear o potencial do cérebro de se curar sozinho e trazer de volta a esperança a pessoas que convivem com a dor.”
A equipe está recrutando participantes para dois novos ensaios: o Spinal Pain Trial, voltado à dor crônica na coluna, e o StoPain Trial, que investigará o uso do PainWaive em pessoas com lesão na medula espinhal. Para mais informações, acesse o site da UNSW.